quarta-feira, setembro 26, 2007

Mudanças repentinas...

Quando a vida nos surpreende e nos oferece algo que não esperávamos, pudemos fugir ou agarrar a oportunidade…
Mas o que é a nossa vida se não arriscarmos na procura de sermos felizes?
Quando cheguei a Cuamba levava na bagagem uma vontade enorme de me encontrar e de descobrir o caminho que me estava reservado. Sempre acreditei que a vida se constrói pelas escolhas que fazemos, no entanto, são escolhas que sucedem dos caminhos que se nos apresentam e não são as mesmas para todos!
Em apenas três meses - dois dos quais em Moçambique e um em Portugal -, toda a minha vida mudou de uma forma que não podia prever antes.
Para melhor ou para pior não posso responder, foi-me dada apenas a hipótese de viver um dos dois caminhos. Mas ao que posso responder é que me sinto feliz, não pelas facilidades que tenho vivido nestes quase dez meses, mas pela paz que encontrei ao preencher um vazio que dentro de mim existia!
E isso que faltava, parecia doer demais, parecia colocar demasiadas questões e parecia ser demasiado importante…
Posso não saber responder se encontrei ou não o que faltava dentro de mim, o que sei é que hoje não sinto essa falta dentro de mim!
Catarina Gimo


quinta-feira, novembro 23, 2006

Nós e os outros...

Hoje estava sentada no comboio, no regresso a casa de uma manhã pouco típica, tinha ido levar a vacina da febre tifóide.
O Sudoku que desde ontem se tem revelado de difícil resolução, a fome que começava a manifestar-se, a perda do comboio anterior por apenas 4 minutos, a mudança de planos para a tarde por ter de ir a casa pôr a outra vacina no frigorífico... Mais um dia é adiada a piscina e a ajuda aos Leigos... Talvez amanhã os Leigos, a natação ficará para a semana, adiada pela terceira semana consecutiva!
O comboio, o soduku, a fome e uma paragem mais longa que o habitual. A estação era Massamá, apenas a quatro estações de casa... Uma voz dentro do comboio avisa que devido a um acidente, a circulação está a decorrer com alguns problemas. Não dizem mais nada! Passa um passageiro e diz que alguém se atirou para a linha do comboio no Cacem e que “Está morto!”. Comentários, zunzuns, suposições,...Outra voz, agora da estação de comboios, que avisa que “a circulação de comboios encontra-se suspensa, assim que houver mais informações comunicaremos.”
Dentro e fora do comboio aumentam as opiniões, insurgem-se os afectados pela espera que não se sabe quando terminará, traçam-se eventuais soluções e critica-se a CP por não ter um plano para estas situações, “seria muito difícil ter um acordo com empresas de autocarros para o transporte de passageiros nestas situações? É tudo uma questão de dinheiro? Então e o serviço que pagamos?”
Ontem, oito e vinte, o comboio, ao contrário do normal, está parado na linha. Está apinhado de gente, ainda mais que o nos outros dias, e não há sinal de começar a andar. Penso no porquê, quando uma voz me informa que houve um acidente no Cacem... Dois comboios parados na estação das Mercês, quantos estarão nas outras estações? A circulação está interrompida nos dois sentidos e não percebo à quanto tempo. Uma aula que tenho de dar às nove horas em Benfica, última aula de uma curso de Informática e eu não sei quando o comboio vai começar a andar. A circulação está suspensa e não há informações de quando deixará de estar...
Dois acidentes... Pessoas feridas ou mortas... Suicídio, homicídio, falta de cuidado a atravessar as linhas ou falta de sinalização numa estação em obras há muito?
Pessoas atrasadas para o trabalho, para a escola, para uma entrevista de emprego ou uma consulta médica. Pessoas num regresso a casa à hora do almoço, com fome, com um almoço para preparar ou com compromissos a que não podem faltar nem tão pouco se atrasar.
Quarenta minutos depois o comboio começa a andar... Para uns tratam-se de uns minutos que pouco importam, para outros são minutos preciosos de um dia ocupado ao máximo!
Hoje, no comboio parado à apenas uns minutos, dou comigo a olhar para o relógio, a pensar quanto tempo irá demorar, no comboio anterior que perdi e que se calhar circulou sem sobressaltos... Sobressaltos... Sou acordada por uma voz interior que me fala de uma pessoa ferida ou morta...
Sobressaltos?! Ali estava eu a pensar apenas em mim, no meu desejo de chegar a casa, pôr a vacina no frigorífico e comer! E entretanto, no Cacem, a não mais de duas estações, alguém estava deitado sob os carris frios, ferido ou morto...
Não me considero uma pessoa egoísta que apenas se preocupa com o seu bem pessoal e que não se interessa pelo outro, muito pelo contrário. E no entanto, ali estava eu, longe da realidade e apenas preocupada com a mudança que isso implicaria no mundinho pequenino do eu! Pensamentos que tive e que me envergonharam perante mim... Comentários que ouvi e que preferia não ter ouvido, pois mostraram-me outros mundinhos, desses que comportam pouco mais que a dimensão pessoal.
Algum tempo depois, quando o comboio começou a andar, quando passámos pelo local do acidente e entraram no comboio testemunhas oculares, ouvi o que parecia não encaixar no que antes tinha sido proferido pelas mesmas pessoas “Coitadinha da Senhora, estava a pedir comida e ninguém lhe dava, então ficou no meio da linha à espera do comboio.”, “Cá, muitas famílias desprezam os idosos e não os ajudam, na minha terra não é assim”, “Devia estar desesperada, e agora sem duas pernas ainda se vai sentir pior...”, “E o comboio, não conseguiu parar?”.
Pessoas centradas em si... Egoístas ou apenas com um sentido de auto-protecção bastante forte? Se todos estivéssemos no Cacem, se pudéssemos ajudar de alguma forma no acidente, quantos de nós teriam ficado, mesmo atrasando-se?!...
Nunca o saberei... Mas preocupa-me esta azáfama a que nos submetemos e que talvez por vezes nos faça esquecer de quem somos verdadeiramente...

sábado, novembro 04, 2006

entre passado e presente...

Recordações...
... de um passado tantas vezes vivivo de formas estranhas e incompreensíveis num presente em que os sentimentos puderam enfim serenar e serem encarados na sua verdadeira dimensão!
Recordações...
... de sentimentos vivivos que se eternizaram no coração, permanecendo vivos, talvez para sempre, talvez apenas até este momento presente!
Tantas memórias, umas esquecidas ou quase esquecidas, e tantas outras - não sei se mais ou se menos -, vividas ainda hoje, fazendo crescer um sorriso ou perder uma lágrima... Ou sentir o nó da garganta, o pulo do coração, o corpo trémulo ou a descarga de adrenalida.
As recordações podem ficar em nós, mas o tempo, esse, passa... E com ele, mesmo que nem tudo passe, passa pelo menos a ansiedade, a presa e a urgência de viver aquilo que parece não ter de ser vivivo... Pelo menos não neste presente!
E neste entremeio, entre passado e presente, surgem novos momentos, futuras recordações que muitas vezes são colocadas em cima das outras... Entre duas prioridades nem sempre ganha a mais antiga, como nem sempre a nova apaga a antiga...
É o doce ciclo da vida, o vai e vem constante daquilo que por vezes vem para ir definitivamente ou que vem para não tornar a ir!
Posso não saber que memórias passadas estão ainda para ser vividas, e muito menos quais os momentos do presente que ganharão a forma de memória eternizada, mas sei reconhecer o brilho no olhar, ou o aperto coração, que faz reconhecer a importância de um momento, seja ele presente, passado ou sonhado!... E sabendo isto, vou tentando viver da forma mais perfeita possivel...
Felismente que neste caminho nunca nos abandona o dom da aprendizagem constante e da constante possibilidade de mudança!
Sim, estou feliz... Sou feliz por me saber a viver aquilo que tenho de viver no tempo em que tem de ser vivido... :)
Viver sem pressas e sem ansiedades... Viver com a máxima entrega e, apesar do medo, com confiança.

quinta-feira, setembro 14, 2006

terça-feira, agosto 29, 2006

"The end"...

Procuro viver intensamente uma vida de amor, de paz e de alegria...
Procuro a certeza de percorrer um caminho com sentido - crescendo, transformando-me e tornando-me na velhinha que passeia pela praia e, ao olhar o mesmo mar que outrora olhava enquanto menina, não sonha agora, não chora, não se angustia perante uma vida que lhe parece perdida, mas sente a paz, o amor e a alegria de quem se entrega e vive plenamente a vida que agora se finda, na mesma praia, com o mesmo mar, ao som de ondas que vêm e vão e deixando pegadas que depressa são apagadas pelo vento ou pelo mar mas que serão guardadas em muitos corações!
Caminha agora mais devagar, saboreando momentos antigos, sorrindo a cada lembrança: sonhos tornados realidade, momentos eternizados, e tantas coisas que nunca sonhou, mas que se revelaram tão importantes quanto os sonhos sonhados!
Imagino essa velhinha, branca, cheia de rugas, com o corpo flácido, o peito descaído, as mãos calejadas e os pés descalços cheios de marcas das pedras do caminho. Vejo-a a caminhar sem hesitações, segura de si e cheia de confiança. Existiu! Viveu! Não foi mais uma alma perdida, mas alguém que de tanto procurar encontrou o trilho das muitas vezes que se perdeu. Não andou ao sabor da corrente, não deixou a sua vida em mãos alheias nem desistiu de um objectivo por medo de uma batalha!
Caminha sem dor, sem mágoa, sem medo, sem frustração, sem solidão... Com ela se funde outro corpo... Caminham como um único ser, numa união perfeita de corpos e alma...
Olho-os, acredito que sejam reais... Acredito que são um sonho tornado realidade! Quero que existam, pois assim sei que valerá a pena todas as pedras que apanhar pelo caminho. É por eles que procuro tanto!
Amor, serenidade, confiança... Amar e ser amada plenamente...
Olho mais uma vez, quero que esta imagem fique guardada para sempre, como luz que ilumina o meu caminho nos momentos em que me vejo rodeada por trevas, dor, desespero, solidão, angústia, medo, frustração, pânico,... Olho para o olhar profundo, para o sorriso doce que permanece o de duas crianças, para as mãos... a União... Solidez, força, plenitude, equilíbrio, completude,... Uma vida entregue ao amor, uma entrega à vida! O coração, cheio de passos pequeninos, de gargalhadas fortes e de abraços quentes... Os meninos de quem cuidaram, que ajudaram a crescer e com quem formaram uma única família! São rostos com nomes, com vidas e com futuros próprios, são adultos que foram outrora crianças abandonadas e mal amadas! Crianças que foram por eles amadas totalmente e que se transformaram em adultos, uns realizados, outros não... Alguns são agora pais exemplares e outros serão pais que abandonarão e que maltratarão... Crianças que sofreram como ninguém merece... Crianças a quem faltou o que é devido a qualquer criança... Crianças rejeitadas por aqueles que lhes deviam amor, respeito e ajuda no processo de crescer! Crianças que apenas foram amadas por estranhos... por dois corpos que se fundem agora naquela praia, junto ao mar que tantas vezes apagou lágrimas de tristeza e que agora apaga as pegadas destes dois corpos que percorrem de mãos dadas o caminho que agora se finda.
Vida que termina, vida que se viveu, vida que se entregou...
Somente o Amor que se dá permanece vivo nos corações de quem tocou!

quarta-feira, agosto 09, 2006

sexta-feira, junho 16, 2006

Um desejo tornado certo!


No início era o sonho...
O sonho de uma criança que queria cuidar de outras crianças e dar-lhes um lar!
O sonho de uma menina que sonhava casar com um negro para lutar contra o racismo!
O sonho de uma adolescente que um dia ouviu falar de uma experiência missionária na Guiné e soube que um dia chegaria a sua vez!
O tempo passou, e o sonho foi crescendo no seu coração, ganhando raízes cada vez mais profundas e ameaçando a todo o momento tornar-se realidade.
O sonho da adolescente concretizou-se quando já era mulher e partiu para África... Em 3 semanas descobriu que a vida se pinta com cores muito mais belas, com aromas mais saborosos e com cheiros mais intensos quando a vida é entregue por amor ao serviço do outro!
A mulher voltou de África com o desejo de voltar, quem sabe para sempre...
Hoje, e após uma caminhada de alguns meses, essa mulher recebeu a confirmação que tanto procurou: o sonho de adolescente, que um dia foi experiência e se tornou em desejo, é agora uma certeza! :)

sexta-feira, maio 19, 2006

Longe...

Talvez o meu coração tenha ficado lá longe... Ou talvez nunca tenha estado no local onde julgava que se encontrava...
Ontem fui à procura para ver se o encontrava e descobri uma caixa vazia no local onde esperava encontrar um coração. Segui várias pistas por meio de um rasto conhecido e encontrei, no meio do pó, uma nova caixa.

"Pó... esta caixa não é aberta há muito tempo, terei eu deixado aqui o meu coração?" Mas nada de coração, no seu interior encontrei apenas uma marca de sangue seco e uma flor...
Segui outras pistas e, uma após outra, fui abrindo as caixas que ía encontrando.
Ainda não terminei... Há tantas caixas por abrir!...
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Longe...
Está longe o meu coração ou sou só eu que estou longe?...
Longe do mundo e dos homens ou apenas do mundo e dos homens que conheço?!...
Sinto-me longe da realidade que vivo... Do país que é o meu, da família que é a minha e de tanta coisa mais que, na teoria, é para mim conhecida!
Desperto com uma frase de Madre Teresa: "a minha família morreu, agora vive apenas no meu coração"...
Viver no coração... Longe e perto.
Perto, porque persistirá para sempre.
Longe, por não fazer mais parte da realidade que busco.
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Mas, onde estará o meu coração?

segunda-feira, maio 08, 2006

Uma resposta interessante...

Parece que aconteceu num voo da British Airways entre Johannesburgo (África do Sul) e Londres...
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Uma mulher branca, de aproximadamente 50 anos, chegou ao seu lugar na classe económica e viu que estava ao lado de um passageiro negro. Visivelmente perturbada, chamou a hospedeira.

"Qual o problema, senhora?" - perguntou a hospedeira.
"Não está a ver?" - respondeu a senhora - "vocês colocaram-me ao lado de um negro. Não posso ficar aqui. Têm de me dar outra cadeira".
"Por favor, acalme-se - disse a hospedeira -"infelizmente, todos os lugares estão ocupados. Porém, vou ver se ainda temos algum disponível".
A hospedeira afastou-se e voltou alguns minutos depois: "Senhora, como eu disse, não há nenhum outro lugar livre na classe económica. Falei com o comandante e ele confirmou que não temos mais nenhum lugar na classe económica. Temos apenas um lugar na primeira classe". E antes que a mulher fizesse algum comentário, continuou: "Veja, é incomum que a nossa companhia permita que um passageiro da classe económica viaje na primeira classe, porém, tendo em vista as circunstâncias, o comandante pensa que seria escandaloso obrigar um passageiro a viajar ao lado de uma pessoa desagradável". E, dirigindo-se ao senhor negro, prosseguiu: "Portanto, senhor, caso queira, por favor, pegue a sua bagagem de mão, pois reservamos para o senhor um lugar na primeira classe..."
Todos os passageiros próximos, que, estupefactos, assistiam à cena, começaram a aplaudir, alguns de pé.

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"O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons."


Martin Luther King

sábado, abril 08, 2006

Uma brecha de uma janela mal fechada...

Todos os dias entram em nossa casa amigos, conhecidos e desconhecidos, uns convidados, outros inesperados. A cada um é confiado um cartão de identificação que lhe permite aceder apenas a determinadas zonas.
Pela porta de entrada, entra-se numa grande sala, cheia de cor e de luz. Ouve-se uma melodia alegre, vinda de um gramofone discretamente instalado a um canto. Sente-se o cheiro suave das flores colhidas pela manhã e o aroma de um chá que espera por ser servido em malgas de barro. Ao olhar em volta, descobrem-se objectos curiosos vindos de vários cantos do mundo. Uma taça de barro, um pormenor do fresco da "Criação do Homem", duas velas laranjas num cadelabro, uma estatueta de pau preto, alguns objectos religiosos, um komboloi, uma taça com água, uma caixa de madeira, um coco pintado, algumas pedras e conchas e uma taça com areia preta. Recordações de viagens e de momentos eternizados...
A outro canto, veêm-se alguns livros, arrumados uns, desarrumados os mais recentes que esperam a sua vez de serem devorados, lidos por olhos sedentos de novas cores e 'vividos' por um coração habituado a sonhar a cada virar de página.
Numa caixa, colocada em cima de uma estante, estão guardados momentos que a lente fotográfica registou com cuidado - as mais singulares, emolduradas, encontram-se espalhadas pelos vários móveis da sala.
Dessa sala, podem-se abrir várias portas, dependendo do cartão de identificação que se possuí. Alguns entram em novas salas, com cores e perfumes bastante diferentes, outros ficam na sala principal e entreteêm-se com a variedade oferecida, sem sequer perceber que são superficiais as coisas que aí podem alcançar!...
De todas as chaves concedidas, nenhuma chega ao quarto, reservado ao proprietário da casa... Mundo de sonhos irreveláveis e de fantasias irrealizáveis. Só nessa divisão se vive o profundo e intímo contacto com a alegria e com a dor dos momentos que não se partilham...
As chaves são entregues a cada pessoa com base na confiança ou simplesmente na oportunidade dos momentos...
Por vezes, pela brecha de uma janela mal fechada, uma leve corrente de ar expõe, a um par de olhos atentos, salas de acesso reservado... É chegada então a hora de escolher: conceder uma chave aos novos visitantes ou afastá-los, tapando-lhes os olhos e fechando a brecha.
Conceder uma chave pode ser mais libertador que afastar um visitante interessado... É verdade que a partilha expõe-nos e que, expostos à nova luz, sentimos uma nudez constrangedora... Mas é também verdade que, através da porta aberta, o cheiro a mofo, deixado pelo longo inverno, pode finalmente desaparecer... Com a porta escancarada, os raios de sol podem penetrar finalmente e mostrar-nos que a falta de luz não é uma propriedade inerente das coisas, mas uma consequência de serem fechadas numa pequena sala.

Aproveitar a brecha ou fechá-la?... Revelar ou calar?... Libertar ou sufocar?...