quinta-feira, janeiro 26, 2006

Amar o mundo como ele é...

Um filme...

"É incrível como seja lá onde for que se descubram matérias-primas, os habitantes locais morram na miséria, os seus filhos se tornem soldados e as suas filhas prostitutas."

(Hubert Sauper)
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Quando a realidade é chocante o que devemos fazer?
Podemos ignorá-la, escondendo-a atrás das maravilhas que nos rodeiam... Ou podemos encará-la, aceitá-la e amá-la!...

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Lembro-me de uma ilha perdida no equador.
De um povo acolheder, alegre e ávido de conhecimento...
Ouço ainda as vozes estridentes, o cheiro da terra e do mar, o sol de inverno quente como o nosso sol de verão, os olhos brilhantes e as mãos esticadas que procuravam tocar-nos!
Calor, amor, alegria, entrega, vida, ...
Lembro-me também do último dia, poucas horas antes da partida para Lisboa. As irmãs Fernandas levaram-nos a conhecer o resort do grupo Pestana, o maior empreendimento turístico de São Tomé. Entrámos, cumprimentámos os empregados, comprámos uns postais e fomos até ao jardim... A lua cheia, as palmeiras e a vegetação harmoniosamente colocada inspiravam belas fotografias. Ía caminhando, fotografando e ouvido os comentários de quem nos guiava. Mas a realidade que via era muito diferente daquela que tinha conhecido nas três semanas anteriores... Pela primeira vez estava a ver São Tomé como teria sido retratado por uma revista turística. Imaginei os cabeçalhos: "Pequeno paraíso perdido no meio do Atlântico sobre a linha do equador"!
Sim é um paraíso, mas não é paradisíaco... As praias não têm longos areais cheios de coqueiros alinhados, o mar não é claro nem transparente e não se veêm os peixinhos de muitas cores a nadar perto de nós! Algumas praias têm pedras em vez de areia, outras estão cobertas por areia preta... Os coqueiros existem, mas são desordenados, com cocos caídos sobre a areia e ramos partidos... Não se vendem cocos com palhinhas de várias cores, e quem quer comer do fruto têm de o abrir com pedras!

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Antes de partir assustava-me a ideia de não saber lidar com a pobreza e de me sentir impotente face às dificuldades... Mas ao chegar lá, a pena transformou-se em amor!
Não os quis mudar, quis antes conhecê-los!
Não lhes quis dar, mas apenas ajudar no que me precisavam!
Em São Tomé amei a realidade que encontrei, sem fugir dela e sem a querer mudar à minha imagem.
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Amei São Tomé, e amo, mas sinto-me incapaz de o fazer em relação a outras realidades... Porque sinto tanta dificuldade em amar o mundo todo como ele é?...
Talvez seja por apenas ver um dos lados: a miséria, a dor, a angústia.

Não os conheço como conheço as pessoas de São Tomé, que, para além da evidente pobreza, tinham os olhos cintilantes e os rostos alegres. Queriam mais, sonhavam com a Europa e com a possibilidade de ter coisas, mas não faziam depender disso a sua felicidade!
Talvez esse seja o segredo... Talvez me falte conseguir perceber a riqueza por trás da pobreza nos locais que não conheço!...
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Desde 3ªfeira que me tenho debatido com esta questão, "Amar o mundo como ele é". Passei por momentos de dúvida quanto ao valor da minha ajuda. Deixei-me levar pelo desespero da impotência. E senti raiva de todos aqueles que, por interesse, contribuem para o aumento da pobreza.
Mas encontrei também pessoas especiais que sabem o valor de um gesto e que acreditam que um sorriso pode fazer a diferença!
Com a ajuda deles hoje dei mais um passo na direcção do amor incondicional...
Obrigada a todos vocês (que sabem quem são) com quem desabafei nestes últimos dois dias.
Obrigada pelo exemplo de vida...
Que bom está a ser esta caminhada / discernimento convosco! ;)

segunda-feira, janeiro 02, 2006

Uma música especial...

Quero partilhar convosco uma música que se tornou muito especial em São Tomé e Principe.
Fazer missão faz-nos crescer, mostrando-nos caminhos de transformação. Encontramos as nossas qualidades, mas também aquilo que espera por ser melhorado...
Rezei esta música várias vezes desde então...
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Perdoa, Senhor, o nosso dia
A ausência de gestos corajosos
A fraqueza dos actos consentidos
A vida dos momentos mal amados
Perdoa o espaço que Te não demos
Perdoa, porque não nos libertamos
Perdoa as correntes que pusemos
Em Ti, Senhor, porque não ousamos
Contudo, faz-nos sentir
Perdoar é esquecer a antiga guerra
E, partindo, recomeçar de novo
Como o sol, que sempre beija a terra.